Em 31
de dezembro de 2019, a China emitiu um alerta para a Organização mundial da
Saúde (OMS) sobre um surto de pneumonia na província de Hubei, mais especificamente,
na cidade de Wuhan. Em 7 de janeiro de 2020, foi identificado o vírus causador
da doença, o novo coronavírus, denominado SARS-CoV-2. A nova doença foi chamada
de COVID-19. Em 11 de janeiro de 2020, ocorreu a primeira morte na China e em
13 de janeiro foi confirmado o primeiro caso em outro país (Tailândia). Este
coronavírus é encontrado, naturalmente, em morcegos e a hipótese mais provável
de como chegou aos seres humanos, é que tenha sido pelo consumo de pangolins
(um mamífero), que seriam os hospedeiros intermediários.
Da
China, a doença se espalhou pelo mundo, com a OMS decretando pandemia em 11 de
março de 2020. A COVID-19 pegou os europeus desprevenidos e, talvez, displicentes
por acharem que seria mais uma gripezinha. O que vimos em março e abril, foram cenas
terríveis na Itália e Espanha, com milhares de pessoas morrendo em um único
dia. O continente europeu inteiro sofreu. Como também sofreram países
asiáticos, principalmente, o Irã.
As
formas de conter esta nova doença, para qual não há remédio específico ou
vacina, já eram conhecidas desde janeiro: isolamento social, lavar mãos com
sabão (ou álcool em gel), usar máscara facial. Veja, as estratégias são para
conter a propagação da doença e, assim, evitar o colapso do sistema de saúde. Os
pacientes com sintomas mais severos têm uma insuficiência respiratória, com
sensação de falta de ar (dispneia), que é ocasionada por forte redução da
oxigenação no sangue. Neste ponto, faz-se necessário o uso de respiradores.
Basicamente, com a pessoa sedada, coloca-se um tubo pela boca, que chega até a
traqueia. A função do respirador é retirar o gás carbônico, injetar oxigênio e
permitir que o pulmão se recupere. Este processo pode levar dias e o respirador
é um equipamento caro e que nem todos os países têm em quantidade suficiente.
Em 26
de fevereiro, oficialmente, a Covid-19 chegou ao Brasil. Quase dois meses após
a China ter alertado a OMS. Antes desta data, o governo federal repatriou brasileiros
que viviam em Wuhan, na China. Foi lançada, pelo ministério da Saúde, campanha
publicitária de como evitar o novo coronavírus. Em 5 de março, registramos a
primeira transmissão interna. Até em então, todos os casos eram pessoas que estiveram
na Europa. A partir desta data, a transmissão passa ser interna ou comunitária.
E, hoje (28 de maio) chegamos a mais de 438.000 casos confirmados e 26.754 mortes.
O Brasil, infelizmente, se tornou o epicentro mundial da Covid-19. Como conseguimos
alcançar esta triste marca?
Podemos
elencar diversas explicações:
a) ter
um presidente que privilegia salvar a economia e empregos, ao invés de vidas;
b) ter
um presidente que insiste em divulgar que a cloroquina é a solução, negando
diversos estudos científicos que dizem o contrário;
c) ter
um presidente que insiste em não seguir as recomendações das autoridades
sanitárias, que não usa máscara facial, abraça pessoas e faz aglomerações;
d) não
estarmos fazendo testes em massa;
e) estarmos
no terceiro ministro da saúde durante a pandemia, sendo que o atual ainda é
interino e nem é médico. É um general;
f) ter
governadores e prefeitos que, a princípio, diziam que estavam fazendo
diferente, mas que agora, devido a pressão de diversos segmentos econômicos,
estão permitindo o retorno das atividades comerciais, sendo que o pico da
pandemia está previsto para final de junho e início de julho.
Só não
elenquei uma, que muitos citariam: a população não ajuda, não faz isolamento
social, insiste em sair nas ruas. Considero que não se pode atribuir qualquer culpa
à população, pois ficou vendo nossos gestores públicos com informações e ações
conflitantes, que foram incapazes de fazerem uma frente única de combate à
propagação da Covid-19. Uma população pobre, com poucos recursos, não tinha
outra opção senão retornar às atividades comerciais. É uma decisão terrível,
principalmente para uma população que não tem uma educação científica sólida,
que possibilitasse fazer uma decisão em evidências científicas.
Temos
uma população que pouco conhece seus cientistas, as instituições de pesquisas e
como é o trabalho do(a) cientista. Conhece pouco também devido à dificuldade (ou
pouco interesse) que os cientistas e as instituições de pesquisas têm para dialogar
com a sociedade. O resultado disso é uma população que muitos são incapazes de compreender
uma conta de energia ou analisar um exame de sangue (http://acaoeducativa.org.br/wp-content/uploads/2014/10/ILC_Letramento-cientifico_um-indicador-para-o-Brasil.pdf).
Não é
de hoje que vivemos a negação da CIÊNCIA. Há o movimento terraplanista, o
movimento anti-VACINA, o movimento da negação da ditadura militar, o de negação
do aquecimento global. As pessoas deixaram de vacinar contra doenças mais
perigosas que a Covid-19. Uma pessoa com sarampo pode transmitir a doença para
outras treze. E, este movimento anti-vacina começou com um estudo fraudado que
associava o aparecimento de autismo com a vacina tríplice viral, que nos protege
contra sarampo, caxumba e rubéola. E, mesmo com esta informação, as pessoas
ainda acreditam nesta fraude. E, infelizmente, é um fenômeno mundial.
Quantos
de nós tivemos professorxs de ciências ou de história que nos instigava a descobrir
os segredos da natureza, a realizar experimentos, a questionar os fatos? Enfim,
quantos compreenderam a beleza do método científico? Eu diria que poucos de nós.
Se temos pessoas que não compreendem como a natureza funciona ou a importância
da cultura e da história, como podemos exigir em momentos cruciais, como este
(pandemia), possam decidir qual seria a estratégia a ser seguida: salvar vidas
ou salvar empregos!
Nossos
professores de pedagogia (os primeiros que deveriam apresentar o método
científico) e mesmo os de ciências, são malformados (além de serem mal
remunerados e trabalharem em escolas com pouca ou nenhuma estrutura adequada).
Como o Dr. Roberto Lent, neurocientista (UFRJ) disse: “...Malformados, porque
as faculdades de pedagogia e de licenciatura ainda têm um viés
conservador-ideológico-intuitivo, indiferente ou hostil às propostas
pedagógicas derivadas do método científico...” (https://cienciahoje.org.br/artigo/a-ciencia-de-ensinar-ciencias/).
Particularmente,
estou cansado de ouvir colegas que estão à frente de cursos de licenciatura,
que um estudante deste curso será somente professor e que poderá fazer pesquisa
na área de ensino. Para um professor de Biologia consiga ensinar Biologia, por
exemplo, precisa, antes de tudo, compreender como são realizadas as pesquisas biológicas,
precisa compreender e vivenciar o método científico. Senão faz isso, como poderá
formar estudantes com uma sólida compreensão científica? Assim, com esta
postura, continuaremos a ter uma sociedade que terá dificuldades em compreender
como a natureza funciona ou qual a importância da cultura e história, que terá dificuldade
em compreender a tecnologia que utiliza, que será incapaz de compreender como aquecimento
global poderá impactar sua vida diária, que será incapaz de evitar novas
pandemias, a não ser que os envolvidos na formação de professores relacionados
ao Ensino de Ciências, comecem a trabalhar em conjunto, respeitando as
diferenças entre as diferentes áreas do conhecimento. O desafio está posto!
Para
saber mais, leia:
Texto: Rogério Pereira Bastos
Laboratório de Herpetologia e Comportamento Animal/ICB/UFG
contato: rogerioiscinax@gmail.com
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